domingo, 12 de março de 2017

REFLETINDO


Fernando Pessoa disse que o céu era grande, a terra larga e o nosso coração do tamanho de um punho fechado. Dentre os elementos da natureza o sentimento é aquele que ocupa o menor espaço...um espaço que não lhe cabe e que não lhe define.
AUTOR
TIAGO R.CARVALHO

UTOPIA DA LIBERDADE



O conceito de liberdade opera uma inversão de formas de opressão: no regime despótico o Estado oprime a vontade, no liberalismo é a consciência que age com força opressora. Como a consciência é variável, e em muitos casos inexistente, tem-se a impressão de que na democracia existe liberdade.
O próprio conceito de liberdade traz em si a proposta de conflito na medida em que o homem se vê abrigado a adequar seus interesses pessoais com o coletivo, ou seja, o homem se torna um alquimista social cuja obrigação é transformar desejo – força sedutora do inconsciente – em vontade. Vontade e desejo são completos opostos: vontade surge da reflexão, da avaliação dos prós e contras; já o desejo é apenas a manifestação do pólo pulsional e primitivo.
A liberdade também possui sua dose de opressão e está se torna clara quando se compreende que o homem, e somente ele, é responsável por seus atos. É essa a força esmagadora que o homem “livre” - o Atlas da modernidade - carrega nos ombros.
O existencialismo define que primeiro o homem existe como um nada e posteriormente define seu nicho social. Trata-se da absoluta negação da essência criadora, do “dom” natural, da aptidão genealógica. O homem segue por caminhos que se definem por meio de suas escolhas. Só em retrospecto ele reconhece suas falhas. Tragicamente essas falhas só se tornaram visíveis quando adquirem o status de incorrigíveis.
A ideia de liberdade ainda se confunde com a de “cada um por si”. O Estado paternalista autoritário faz despertar a natureza rebelde do homem que mergulha no rumo da busca por liberdade sem saber que ruma para novas formas de opressão. Liberdade não é cada um por si! Cada atitude individual possui um eco coletivo, viver como um Robinson Cruzoe não é uma opção é apenas uma utopia.
AUTOR
TIAGO RODRIGUES CARVALHO

FELICIDADE DA TRAGEDIA ALHEIA (DESABAFO)


Quem nunca se deparou com um daqueles vídeos que mostram pessoas sem um dos braços ou sem pernas lutando para realizar algum tipo de atividade e logo no fim aparece aquela clássica frase: “E você ai reclamando da vida!”
O engraçado é que essas pessoas acreditam que estão prestando algum tipo de ajuda. São estas as mesmas pessoas que acham que depressão ou a recorrente tristeza se cura através da exposição da desgraça alheia. Certamente quem pensa assim nunca passou por uma situação de tristeza profunda que se caracteriza como doença.
Pessoas que postam fotos de portadores de doenças terminais com a mensagem “e você ai reclamando da vida” são maquiadores sociais, falsos sonhadores que adotam a pratica midiática de tentar mostrar que defeitos só existem-nos outros. Finja que você é perfeito e sorria com seu alto engano.
Se esta deprimido veja imagens de tragédias para sorrir! Já repararam a ironia disto? A imagem de um pobre coitado faminto é o remédio para a felicidade de tantos outros. Que planeta absurdo é esse em que vivemos? Imagens de pessoas na miséria chocam. A imagem sufoca o conceito por trás dela. O fotografo que acredita estar levando ao conhecimento de todos o retrato da barbárie não imaginava que sua fotografia serviria apenas como uma régua que mede a distancia de cada um da desgraça.
Adeptos da máxima “uma imagem vale mais que mil palavras” eles espalham vídeos e fotos de tragédias para provocar o riso. Para uma pessoa deprimida uma imagem não possui a força de mil palavras. Uma pessoa deprimida não quer ver tragédia, quer ser ouvido! Saber que existem outros que também sofrem como ele reforça sua própria dor.
O que mais dói é ver que existem pessoas que acham que meus problemas e minhas dores desaparecem diante de imagens trágicas. Que meu sorriso aparece diante da imagem de uma criança faminta e sem braços. Se enxerguem! Se não sabem o que dizer então não digam nada! O silencio de um ombro amigo é o que de fato alivia os demônios internos de nossa consciência. Uma pessoa deprimida não espera encontrar uma tragédia maior que a sua. Uma pessoa deprimida somente busca enxergar aquilo que a vida tem de melhor.
AUTOR
TIAGO RODRIGUES CARVALHO

MUITO PERTO DE LUGAR NENHUM


Foi à introdução da hierarquia no seguimento social que levou a subjugação do homem pelo próprio homem. Nas sociedades tribais e pouco organizadas seus membros se encontravam em relativa igualdade. Não se via ali pirâmide social de classe ou uma distribuição desigual de recursos. Era uma realidade idílica - se deixarmos de considerar a violência desencadeada pela luta individual por sobrevivência contra a natureza.
A natureza era ao mesmo tempo provedora e opressora. Fornecia ao homem os meios para sua sobrevivência e também o atormentavam com o calor, o frio, as inundações, os insetos, as doenças. Para evoluir o homem buscou dominá-la. Para isso se organizou: desenvolveu ferramentas, adotou uma linguagem para que pudessem se comunicar uns com os outros, desenvolveu os costumes, as crenças, ou deuses. As sociedades foram se unificando através do comercio e da cultura. Criou-se os valores éticos, o espaço geográfico se retraiu com a criação do automóvel e do avião. Os oceanos deixaram de serem obstáculos e os temíveis monstros marinhos se tornaram lendas.
A sociedade se tornou mais complexa, ramificada, imiscível. Critérios de separação foram criados e outorgados. Roupas “brancas” não deveriam ser misturadas com as roupas “de cor” na maquina social depravada pela ignorância conveniente. Teve inicio a escravidão, inicialmente criada a partir de conceitos étnicos. O negro, no entanto, podia ser consumidor, poderia aquecer o comercio. Um novo nicho social surgia para estes indivíduos marginalizados e novos gritos percorriam as ruas: Chega de escravidão! Escravo não é consumidor! Liberte-os! Libertados eles foram - não da sua condição de escravo, mas somente da sua imagem.
Mas a “maquina” continuou buscando métodos de subjugação. Os negros deixaram as senzalas e os pobres ingressaram nas fabricas - Ignorantes, porem fortes. Trabalho era a palavra de ordem! Doze horas por dia, sete dias por semana. Era a escravidão moderna com sua base ideológica pressa a um conceito de classe. Saem às grandes fabricas, vai-se embora a exploração desumana do século XIX. Surge à publicidade, a oferta de inutilidades úteis - o século XXI a luz das possibilidades do comercio.
Criaram-se necessidades por meio da linguagem conativa publicitária, aprisionou-se novamente o homem que se tornou escravo de seus desejos. Até onde iremos chegar? Impossível não se lembrar dos enigmáticos versos da obra “Paraíso Perdido”, de John Milton (124-25, Canto III): “Formei-os livres, livres ficaram, Até serem de si reféns.”
AUTOR
TIAGO RODRIGUES CARVALHO